30.11.05
Diálogo em família:
Irmão: - Saiu o dvd do Araketu.
Eu: - ...
Irmão: - Saiu, saiu...
Eu: - Espero que não volte.
Mãe: - Não faz isso com seu irmão. Vou comprar pra você, meu filho, "O Melhor do Araketu".
Irmão: - Viu!?!
Eu: - Vai vir um cd virgem, sem nada gravado.
no dia seguinte... adivinha a trilha sonora da casa...?
28.11.05
Fato!
O cheiro do jornal quando fica no sol é igual ao cheiro de cocô de tartaruga. (eu já tive uma tartaruga; e, minha varanda, onde o jornal fica largado, bate sol a tarde toda).
27.11.05
somos todos sós? qual é a figura da solidão? uma rua deserta? um prato de comida, sobre a mesa, por terminar? uma criança em seu enconderijo? um fantasma na noite? um piano aberto? um pé de chinelo no canto do quarto? um quarto? um chuveiro pingando, lentamente? jesus na cruz? um mapa de um lugar desconhecido? um casal de namorado contando estrelas? as estrelas?
26.11.05
(quem tiver paciência...)
Ela estava parada no sinal. Não sabia se tinha se passando um, meio ou três minutos. Se a música do rádio tinha mudado, não tinha percebido. A melodia parecia a mesma; e a letra era algo falando de um amor perdido. E não era esse o assunto de todas as músicas, o eterno amor inalcançável? Ah, os românticos modernos, fingindo sentir dor a dor que nunca sentiram! A paisagem era a mesma de todos os dias. Um sinal vermelho a sua frente, a linha de pedestre pintado no chão indicando o lugar exato das pessoas passarem. Eram centenas de pessoas a atravessarem a rua. Um "estouro da boiada" pensou ela (embora nunca tivesse visto um estouro de boiada, essa expressão e imagem vinham a sua cabeça). Era impossível não igualar os homens a bois, a porcos, a cachorros ou qualquer outro bicho. Fome, sexo, sentindo de preservação da espécie - esse é o resumo de todos os homens. Os homens e os bichos: o trânsito caótico, engarrafado, tenso, tinha tudo para aflorar a igualdade entre o jovem de mais ou menos 26, 27 anos, da pick-up quatro portas, cabine dupla, vermelha, parado ao seu lado a um animal. Lembrou dos programas do Discorey Channel, a savana da áfrica. Cada fera disputando seu espaço. Quem chega primeiro se apodera do lugar, mas se chega um animal mais forte, os primeiros tem que sair, por livre e espontâneo sentido da tal preservação da espécie. Os carros enfileirados. A paisagem não era de uma savana africana, mas não fazia diferença. Tirando os imensos outdoors, com seus imensos anúncios, tudo parecia com o mesmo palco de disputa de espaço do Discorery Channel. Ganha quem for mais forte; no caso do trânsito, quem tem o carro 2.8. Não era seu caso. Mas isso pouco importava, a velocidade média que se andava na hora de voltar pra casa, era de 15, 20 km/h. Num jogo de paciência de primeira, segunda, e de vez em quando, terceira marcha. O jovem da pick-up vermelha ao seu lado, certamente se sentia frustrado com isso. Sua ansiedade era visível, apesar dos vidros estarem levantados. "Um carro desse, pra andar a 20 km/h", pensou rindo, "deve ser realmente frustrante". E continuou: "talvez a inteligência faça diferença no trânsito, os sábios vencem esse "rame-rame" de segunda e terceira marcha sem apontar a arma para ninguém por motivo fútil". Bem, concluído a diferença entre a Savana africana e a avenida Rio Branco, às seis horas da tarde, ela olhou para o seu outro lado e viu um ônibus levando mais pessoas do que o seu limite legal. "Dois corpos não podem ocupar ao mesmo tempo o mesmo espaço, não foi isso que Newton provou? Ele não conhecia os ônibus do Rio de Janeiro com certeza. Era a tal exceção a regra, não existia isso?" Num misto de nostalgia e horror, lembrou dos seus dias de passageira de ônibus lotado, e suas viagens pelos bairros do Rio sobre as rodas destes coletivos. E se suas histórias de ônibus com seus passageiros não dariam um best seller ou um longa metragem indicado ao Oscar, dariam ao menos uma crônica, ou um curta, ou talvez mesmo um conto engraçado pra se contar na mesa de um bar. Lembrou destes personagens e deste universo que por um longo tempo fizeram parte de sua vida: o motorista que não parava no ponto; ou aquele que deixava ela na porta da casa, embora não fosse ponto ali; do trocador que dormia e não percebia que vários passageiros entravam sem pagar; do estudante que fingia dormir pra não ceder o lugar quando entrava uma senhora idosa pela porta da frente; do bebê que chorava bem alto a viagem inteira; do trabalhador com cecê; da menina com tanto creme no cabelo que pingava no chão do ônibus; dos vendedores de chiclete, paçoca, caneta, espremedor de laranja, cortador de legumes, tabuada, livro de ervas medicinais, manual da empregada doméstica, chocolate que na "loja americana sai a 1,50 cada e na mão do vendedor custa apenas 50 centavos", do amendoim, do refrigerante, do hula-hula, do "guaraprus", da bala de menta, iogurte, banana, do coração, dos que podiam estar roubando, assaltando, estuprando, mas está ali pedindo a colaboração da gente; das baratas entre os bancos nos dias mais quentes de verão; da promoção de inverno nos ônibus com ar condicionado; das pessoas perdidas que pediam informação a todo o ônibus pra saber onde saltar; nos olhares discriminatórios e medrosos quando um negro mal vestido entrava no ônibus; das ameaças de assalto; dos assaltos frustrados; dos verdadeiros assaltos; dos dias de chuva de verão com as janelas todas fechadas e um calor de estufa dentro do ônibus; das freadas bruscas que sempre fazia um engraçadinho gritar: "agora ajeitou todo mundo!"; dos bem humorados; dos mal humorados; dos velhos tarados; dos jovens com pernas abertas; das moças com saias curtas pra deleite dos homens; dos malucos falantes; dos walkmens berrando; do aviso pregado no vidro "fale apenas o indispensável ao motorista";da vista que se tinha do banco alto do ônibus; da possibilidade de se apreciar esta vista, a arquitetura, a baía de Guanabara, o sol, o céu bem azul, sem qualquer nuvem, as pessoas indo e vindo, os motorista dos carros parado ao seu lado. De repente se viu! Um, meio, três minutos? O pensamento sumiu, instantaneamente, diante da luz verde. Amanhã o caminho será o mesmo, mas os pensamentos?
(alguém?)
24.11.05
"Pois se há (por acaso) 76 tempos diferentes, todos pulsando simultaneamente na cabeça, quantas pessoas diferentes não haverá, todas morando, num tempo ou noutro, no espírito humano?"
(Virginia Woolf in ORLANDO)
23.11.05
Boas novas (boas não, ótima!!!)
Vou ser titia. (Atenção por favor, eu disse "vou ser" e não "fiquei para") Titia de primeira viagem. Olha que maravilha. Uma criança para eu poder fazer todas as graças possíveis e inimagináveis; para eu deseducar, para fazer bastante "gulinia". Para quando a mãe dela pertubar muito ela fugir para minha casa. Essas coisas de tia babona. Porque se eu já estou babando agora, com a criaturinha medindo menos de um centímetro, imagina quando virar realmente gente, com nome e sobrenome.
(Menos de um centímetro, eu fiquei chocada com essa informação. Menor que uma ponta... Vocês tem noção?!?!? Mamãe Angelique não gostou quando eu comparei seu filhote com um beque. Mas acontece...)
16.11.05
Quem pergunta quer saber...
Por que os helicópteros (do exécito) são camuflados de verde? Não seria mais sensato se eles fossem camuflados de azul com pinceladas brancas?
14.11.05
...
Que arma é essa, a escrita, que fica? Que fica depois de irmos embora. As cartas de amor de uma paixão que não existe mais, os bilhetes grudados na geladeira com tarefas já cumpridas, avisos na mesa de trabalho de telefonemas já retornados, recado no pé da cama do filho que não volta mais para casa, lista de compras que já foram feitas. E o que falta? Um beijo ardente, varrer a cozinha, ligar para o advogado ou dizer ao pé do ouvido que irá chegar mais tarde? O que falta? O que faltou? Faltou açúcar? Manteiga eu trouxe, ovos... O que se deixou de cumprir das notas de papel? O que foi escrito foi feito? Foi sentido? Amaram uns aos outros como Ele amou? Foste responsável pelo que cativaste? Escutaste o inaudível? Está escrito, mas terá sido sentido? Que arma é essa que fica como promessa esperançosa? Que fica até o quanto resistir a tinta da caneta e a folha de papel. E as fotos? Os retratos de família dos anos 10 ou 20, não são todos iguais? O chefe da família com largos bigodes. Mulheres com longas saias e crianças com semblantes cerrados. Ai daquele que ousar dar um sorriso. São todos iguais? Seremos iguais em foto, em texto, em som, em vídeo, daqui a 50 anos? Sorrimos hoje? E amanhã, haverá um sorriso maior, mais largo, mais contagiante que fará os nossos sorrisos soarem como tristeza? O que fica? Um texto, uma palavra, um rosto, um sorriso – uma interpretação. O que posso fazer para mais tarde, aquela foto; não, esta foto, esta que tenho a mão, que você me presenteou com uma dedicatória... o que posso fazer para que esse sorriso, esse sorriso tão belo não seja interpretado além ou aquém de um belo sorriso? Ah, e a dedicatória!?! As dedicatórias tão curtas e tão definitivas – sentido de eternidade: Seja Feliz, te amo para sempre... lembranças. Tudo com grande sentido de não ter duração, tudo como se sempre fosse, sempre foi, sempre será, sempre é. O que fica destas armas? Da escrita, da dedicatória (pequena, singela, eterna), do sorriso, dessa fotografia? Das lágrimas nada fica, evaporam, mas deste papel... – recordações.
4.11.05
Achados e Perdidos de uma gaveta esquecida
Resolvi arrumar a "gaveta de papéis"... Todo mundo tem uma "gaveta de papéis". E como cabe papel em uma gaveta, já percebram isso? Você joga metade das coisas fora e ainda assim sobram muitas coisas. A gaveta sempre cheia... Achei isso, escrito algum dia por mim, sem muita razão e como não posto a muito tempo, vai isso mesmo:
"Hoje o sol brilhou, mas a temperatura se manteve amena. O céu bem azul, com poucas nuvens: a paisagem típica do Rio de Janeiro, essa cidade que me provoca admiração e me entorpece.
Seu trânsito caótico e mal educado, seus espigões que bloqueiam a vista do horizonte, as montanhas que irrompem as ruas. A calçada estreita, as ruas largas, os ônibus cheios e os carros de passeio levando uma ou duas pessoas. O marrom da favela em contrate ao verde da floresta. O mico que salta de galho em galho em qualquer parque da cidade. As frutas maduras nas barracas das feiras. A areia que invade o calçadão na ressaca. Os escritórios sem janelas, as janelas sem vista, as vistas tão belas. A lua em pleno meio dia O casario colonial recebendo uma mão de tinta. As arcos que não levam mais água. A ladeira que não leva ao morro. As mãos acenando para um conhecido que passa do outro lado da calçada. A bermuda, a camiseta e o chinelo. A gíria do funk no meio do asfalto. O apito do guarda, em vão, tentando organizar o trânsito. O carro parado na faixa de pedestre. A passarela que ninguém atravessa. O outdoor recebendo uma nova propaganda. O mau cheiro da baía. O apito da barca que vai partir pra Niterói. Radial Oeste engarrafada, trânsito lento na Borges de Medeiros, engavetamento na Avenida Brasil. Estação em curva, cuidado com o vão. A praça desabitada, o garçom implorando um cliente. O cinema com sessão popular. Ante da meia noite damas grátis. As grades pontiagudas. As lajes com piscina de plástico. A cadeira de praia em frente ao portão. O saxofonista na porta do metrô. O peruano clandestino vendendo artesanato. O grupo de pagode com pandeiro esticado pedindo uma contribuição. As baratas dos bueiros. O podrão com ovo de codorna e batata palha. Os jovens instrumentistas de uma banda de chorinho. As barracas azuis da feira de livro. O repentista da feira dos nordestinos. O pitbull que avança na criança passeia sem coleira e sem focinheira. O vôlei na praia. As prostitutas em Copacabana, na praça Tiradentes, na Glória. O mar aterrado. O aterro com pista de alta velocidade. A bandeira verde e amarela sobre o túmulo do soldado desconhecido. A escultura em homenagem a Drummond, o muro com grafites coloridos. A igreja de costa para avenida. A PM fazendo segurança do Fla-Flu. Os cambistas na porta da casa de show. O museu passarela de moda. As ruas alagadas da forte chuva de verão..."
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